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Em março de 2025, a cinegrafista norueguesa Jannicke Mikkelsen, de 39 anos, fez história ao liderar o primeiro voo espacial humano em órbita polar, tornando-se a primeira mulher da Noruega a viajar ao espaço. À frente da missão privada Fram2, da SpaceX, Mikkelsen comandou a nave Crew Dragon a 27 mil km/h, na qual cruzou os dois polos da Terra 56 vezes, enfrentando forças G extremas. E voltou em segurança para contar sua experiência.
"Nós éramos em quatro novatos, e eu fui a comandante. E, como você pode imaginar, quando você leva seu veículo espacial da Terra para a órbita e todo mundo sobrevive, isso é algo para celebrar", disse a norueguesa durante palestra nesta terça-feira (4) na 36ª edição do Encontro Internacional de Astronautas (36th Planetary Congress), que acontece pela primeira vez no Brasil, até esta sexta-feira (7), em Mogi das Cruzes.
Especializada em fotografia 3D, realidade virtual e efeitos visuais, Mikkelsen viveu no arquipélago norueguês de Svalbard, um lugar inóspito, rodeado por geleiras, com invernos de - 16 ºC (no verão, 4 ºC) e grandes áreas cobertas por permafrost, camada de solo gelado que não derrete nunca.
"Eu honestamente acho que minha vida me preparou para ser uma astronauta. Há várias similaridades. Viver no Ártico é como viver na Lua, só que esta lua tem oxigênio e também ursos polares. Há 3 mil ursos polares e 2,5 mil pessoas [em Svalbard]", ela diz.
A trajetória de Mikkelsen é marcada pela superação de adversidades. Aos 10 anos, sofreu um acidente de cavalo que a deixou temporariamente em uma cadeira de rodas, obrigando-a a reaprender a andar. Dois anos depois, aos 12, ela se candidatou a um emprego na NASA — e chegou a passar na primeira fase de seleção.
Após se recuperar, Mikkelsen tornou-se patinadora de velocidade, e chegou a treinar para as Olimpíadas, antes de se dedicar ao cinema, unindo mais tarde suas paixões por arte, ciência e exploração em uma carreira única.
Na noite de 31 de março deste ano, Jannicke Mikkelsen partiu do Centro Espacial John F. Kennedy, na Flórida (EUA), a bordo da missão Fram2. A jornada foi batizada em homenagem ao lendário navio norueguês Fram, o primeiro a completar expedições tanto ao Polo Norte quanto ao Polo Sul, entre 1893 e 1912.
Na madrugada que antecedeu o lançamento, Mikkelsen manteve a calma com a precisão de quem segue um checklist: se despediu da família, escreveu uma carta de adeus ao marido e aos familiares e dormiu oito horas seguidas. O preparo psicológico ajudou a conter a ansiedade — embora, como ela admite, os pais tenham sofrido mais que ela própria com a despedida.
Em entrevista à GALILEU, a norueguesa conta que soube que iria ao espaço dois anos antes, e passou 14 meses em treinamento intensivo. "O treinamento garante que a gente não vai ter medo. Nós não gritamos o caminho todo até chegarmos ao espaço", brinca a cinegrafista.
"Nosso treinamento é o de astronautas, treinamento básico e certificação para o voo", explica. "Nós passamos por tudo: treinamento médico e de centrifugação, onde aprendemos a lidar com a força G, e você tem que aprender a respirar corretamente, e a não desmaiar".
Jannicke com os outros astronautas da missão Fram2 — Foto: @SpaceX/X Mikkelsen acrescenta que também recebeu instrução para operar os sistemas e computadores da missão. "Nós recebemos a mesma coisa [que o treino dos astronautas tradicionais], mas tudo é resumido em um período mais curto", afirma. "Nós representamos uma nova geração de astronautas. E haverá muitos outros que seguirão esse caminho onde nós não somos empregados pelo governo".
Normalmente, em voos chefiados por governos, a espaçonave Crew Dragon tem como destino a Estação Espacial Internacional (ISS). Desta vez, porém, a missão privada Fram2 seguiu uma rota inédita em direção aos polos da Terra. "Quando você não abastece na ISS, isso significa que não leva um monte de oxigênio a bordo", afirmou Mikkelsen, durante sua palestra. "Você só pode se equipar com oxigênio para cerca de 5 dias em órbita".
Por isso, a missão teve duração de pouco mais de três dias, com três janelas de oportunidade para o retorno à Terra. A primeira tentativa de reentrada foi bem-sucedida. Caso contrário, os viajantes espaciais teriam que esperar 24 horas para a próxima chance. Se ainda assim não conseguissem, seriam 48 horas para a última tentativa.
Jannicke em imagem tirada no espaço — Foto: @astro_jannicke/X Pela cúpula da nave, a especialista em cinematografia fez registros inéditos dos polos. "É mais fácil ser uma cinegrafista no espaço do que no planeta Terra", considera. "Mas o problema é que é muito fácil perder coisas, porque flutuam".
Durante a viagem espacial, ela até fez um vídeo sob a cidade de Svalbard, honrando seus conterrâneos noruegueses. Veja:
Entre os principais feitos da missão da qual Mikkelsen fez parte estão a primeira imagem de raio X realizada no espaço — que revela os ossos da mão da norueguesa — e registros deslumbrantes da aurora sobre o Ártico e a Antártida.
Os quatro astronautas privados a bordo da missão Fram2 da SpaceX enviaram à Terra esta imagem da Antártida e da região do polo sul da Terra — Foto: Fram2/SpaceX As imagens trazem dados científicos inéditos sobre a atmosfera superior da Terra capazes de contribuir para o desenvolvimento de satélites mais sustentáveis e eficientes em órbita. "O planeta azul que eu aprendi na escola, eu não vi esse planeta azul. Isso me confundiu a princípio, porque o que eu via foi mais um planeta branco e frio", descreve a astronauta.
Segundo ela, ao todo, foram registrados 40 Terabytes de vídeo do espaço, tudo em definição 8K. Mas, até agora, menos de 10% desse material foi processado.
No espaço, as medidas de segurança precisam ser levadas a sério. Até para poder soltar seu cabelo a artista visual tinha que pedir permissão para o controle de missão na Terra. "Não poderíamos fazer nada que nos causasse enjoo, porque raramente conseguiríamos sarar de uma doença espacial em uma duração tão curta", relata.
Os viajantes espaciais participaram de diversos experimentos científicos, programados para durar oito horas por dia. Na prática, porém, o tempo foi reduzido para cerca de quatro horas, já que fazer ciência no espaço está longe de ser uma tarefa simples — ainda mais durante o primeiro voo de toda a tripulação. Só para ir ao banheiro pela primeira vez, por exemplo, Mikkelsen demorou 22 minutos.
Por estarem viajando por uma região até então inexplorada pela humanidade, havia o receio de que a nave pudesse colidir com um meteorito ou um pedaço de lixo espacial. Em um dos momentos mais tensos da missão, a norueguesa avistou o que parecia ser um meteorito se aproximando — algo assustador, mas também uma oportunidade perfeita para um registro fotográfico.
"Eu pensei: 'isso vai ser incrível, será fantástico quando chegar à atmosfera, vai quebrar como um foguete. Mas não foi assim. Ele simplesmente passou direto. Aí, havia uma nuvem laranja, e eu pensei, o que é isso? A luz natural é a luz branca, não laranja", lembra.
Foi então que Mikkelsen percebeu se tratar, na verdade, da passagem de um míssil: um lembrete brutal de que, mesmo com a aparente sensação de paz que a vista do espaço proporciona, a Terra continua marcada por conflitos. "Aquela mesma tecnologia incrível que me levou para o espaço é a mesma tecnologia que é usada para matar pessoas", diz.
Para a norueguesa, o contraste entre a beleza do planeta e a violência humana fez nascer um novo propósito. Agora, participando de palestras e criando um documentário inspirador sobre sua jornada, a filmmaker busca transformar essa vivência em legado: inspirar jovens a se tornar os próximos astronautas, engenheiros espaciais e cientistas.

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