MVNOs cobram segurança regulatória e mercado de espectro mais aberto

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A integração entre redes, modelos de negócios digitais e políticas públicas foi o centro do debate no painel “Integração de Ecossistemas: MVNEs, Multioperadoras e Políticas Públicas”, realizado nesta terça-feira, 19 de novembro, no evento promovido pelo Tele.Síntese em São Paulo. Na prática, a conversa abordou a existência de desalinhamento entre inovação tecnológica e as regras que regulam o setor.

Executivos da Eseye, NLT Telecom, iuh! e Skeelo dividiram a mesa com o presidente da ABINC, Paulo José Spaccaquerche, que mediou a discussão. A conversa começou com um desafio simples: como redes privativas e IoT podem acelerar os negócios? A resposta, comum entre os painelistas, veio carregada de crítica: o problema não está na tecnologia — está na regulação.

A surpresa do PGMC

André Martins, CEO da NLT Telecom, foi direto ao abordar a mudança de postura da Anatel sobre o Plano Geral de Metas de Competição (PGMC). Segundo ele, o novo modelo, aprovado neste ano, abandonou critérios que davam previsibilidade às relações entre operadoras de rede e prestadoras de pequeno porte.

“Fomos muito surpreendidos quando a Anatel simplesmente resolveu mudar a postura. Agora está tudo liberado”, observou. A seu ver, no entanto, há assimetria na capacidade de negociar entre MVNOs e grandes operadoras.

Para ele, a ausência de parâmetros mínimos para preços, prazos e condições contratuais enfraquece a atuação das operadoras móveis virtuais e das MVNEs — empresas que operam como habilitadoras de redes celulares.

“Estamos com a tecnologia muito mais avançada do que a regulação. Falta regra clara sobre multirrede, sobre acesso justo, sobre uso compartilhado”, falou.

Redes privativas fora do Fust

A crítica ao modelo regulatório também veio de Laerte Magalhães, CEO da iuh!, operadora que atua com foco em projetos de conectividade educacional. Para ele, o setor precisa pressionar por mudanças que permitam financiar redes privativas com recursos públicos, como os do Fust.

“O fundo foi reativado, tem recursos não reembolsáveis, mas ainda não inclui redes privativas no seu escopo. Isso precisa mudar”, sugeriu,

Magalhães citou como exemplo o projeto Internet Brasil, que distribui chips a estudantes de baixa renda, e defendeu que redes celulares privadas poderiam atender tanto alunos quanto trabalhadores em áreas rurais — algo que hoje esbarra em limitações legais. Ou seja, que redes privativas possam ser utilizadas também para conexão à rede pública.

Espectro ocioso e ausência de mercado secundário

O uso eficiente do espectro também entrou em pauta. A ausência de políticas para reaproveitamento de frequências em locais onde as grandes operadoras não atuam foi classificada como uma barreira à expansão da conectividade fora dos grandes centros.

“A Anatel fala em uso eficiente, mas não cria instrumentos para isso. O espectro fica parado e ninguém pode usar”, afirmou Magalhães.

A questão também foi abordada por André Martins, que defendeu a possibilidade de ISPs ou MVNOs implantarem redes públicas com espectro ocioso em pequenas cidades:

“Se a operadora comprou o espectro e não está usando, por que não permitir que outra empresa leve conectividade para uma escola, por exemplo?”

Global é possível, mas o Brasil exige tropicalização

Com presença global em mais de 190 países, a Eseye trouxe ao painel a visão de quem atua com conectividade móvel em escala mundial. A CEO da empresa no Brasil, Ana Carolina Bussab, destacou que o país exige soluções adaptadas, tanto tecnicamente quanto regulatoriamente.

“O Brasil tem particularidades que exigem tropicalização. Nem sempre o que funciona lá fora vai funcionar aqui. Mas, curiosamente, às vezes o que criamos aqui funciona melhor que o modelo original.”

A Eseye trabalha com chips agnósticos e SIMs programáveis, capazes de alternar entre redes conforme a cobertura. Apesar da tecnologia avançada, Bussab disse que o ambiente brasileiro ainda impõe obstáculos operacionais e jurídicos, como a definição do roaming permanente. A seu ver, em localidades onde exista apenas uma rede móvel, o limite de uso anual da rede por 90 dias pelo ocupante usuário de um serviço IoT deveria ser suspenso ou flexibilizado.

Conteúdo digital

Já Rafael Lunes, vice-presidente da Skeelo, apontou a expansão da conectividade como peça-chave para a democratização do acesso à leitura. A empresa atua com distribuição digital de livros por meio de parcerias com operadoras e provedores de internet.

“Quanto mais conectividade, mais estradas viáveis para a gente distribuir conteúdo relevante.”

Apesar disso, ele também observou que o setor de espectro continua “mais travado” que o mercado de banda larga fixa, onde os ISPs avançaram com menos interferência regulatória.

“No mercado de internet residencial, o crescimento aconteceu. No móvel, há muita proteção e limitação.”

Exclusividade, desequilíbrio e o papel do regulador

O tema da exclusividade contratual entre operadoras de rede e MVNOs gerou consenso entre os painelistas: é preciso evitar que acordos comerciais impeçam a competição. Martins defendeu que a exclusividade só se justifique quando a operadora realmente tiver rede na localidade.

Magalhães sugeriu uma alternativa contratual:

“Você pode dar à operadora um direito de última recusa. Se ela tiver rede e oferecer o melhor preço, tudo bem. Se não tiver, a MVNO pode buscar outra parceira.”

“Chegamos a um ponto em que a tecnologia avança mais rápido que a norma. Ou o regulador acompanha, ou o país vai continuar iluminado apenas onde já há luz”, resumiu Martins.

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