Estes sapos machos se tornam amarelos só dois dias no ano. Estudo explicou por quê

há 1 dia 4
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Os sapos-comuns-asiáticos (Duttaphrynus melanostictus) são discretos durante a maior parte do ano – têm cor marrom, ficam camuflados e passam praticamente invisíveis nas poças e margens de rios do sudeste asiático. Mas, quando chegam as primeiras chuvas de monção, algo surpreendente acontece: em cerca de dez minutos, os machos mudam completamente de cor, passando do marrom opaco para um amarelo brilhante que cobre todo o corpo. Feitiçaria? Não, apenas biologia.

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Cientistas sabiam há décadas que essa mudança coincidia com o evento anual de reprodução, que dura apenas dois dias. Mas só recentemente, em um artigo publicado na revista Ichthyology & Herpetology em setembro, os pesquisadores conseguiram confirmar o papel por trás dessa transformação.

Para desvendar o mistério, a equipe resolveu literalmente “se tornar o sapo”. Usando um modelo computacional baseado em dados sobre o espectro das cores dos animais, os cientistas criaram um simulador de visão, permitindo-lhes enxergar o mundo pelos olhos do anfíbio.

Com esse simulador, foram confeccionados dois modelos realistas: um sapo marrom e outro amarelo brilhante. Durante os experimentos, os modelos foram colocados próximos a sapos machos em plena época de acasalamento. O resultado foi imediato.

Segundo o artigo, durante os experimentos com os modelos, os machos tiveram o dobro de contato físico com os modelos marrons e os abraçaram (movimento sexual conhecido como "amplexo") 40 vezes mais frequentemente do que os modelos amarelos.

Doris Preininger, do Zoológico de Schönbrunn, em Viena, afirmou em entrevista ao Mongabay que os sapos machos copulam com tudo o que é marrom, inclusive com outros machos.

 Susanne Stückler e Doris Preininger Enquanto machos de outras espécies costumam exibir cores vibrantes para atrair fêmeas, esses sapos ficam amarelos para repelir outros machos — Foto: Susanne Stückler e Doris Preininger

Os autores do estudo sugerem que o chamado dicromatismo sexual dinâmico – a mudança temporária de cor – atua como um sinal visual vital que facilita o reconhecimento rápido de parceiros em grupos densos e barulhentos.

“Sugerimos que o dicromatismo sexual dinâmico no sapo-comum-asiático evoluiu como um sinal visual que facilita o reconhecimento rápido de parceiros em grupos reprodutivos densos e com tempo de reprodução limitado”, escreveram os pesquisadores.

Para Susanne Stückler, o amarelo vibrante é uma solução evolutiva prática para um ambiente competitivo e repleto de indivíduos excitados, onde os machos não têm tempo para verificar se estão sobre uma fêmea – ou sobre outro sapo, uma pedra ou qualquer outro animal – porque o momento da excitação é quase que instantâneo. Nesse momento, ficar amarelo é, essencialmente, uma maneira de avisar aos outros machos: “não tente acasalar comigo”.

 Susanne Stückler e Doris Preininger O fenômeno de sapos machos, geralmente de cor marrom opaca, mudarem para um amarelo brilhante para sinalizar a prontidão para o acasalamento, é chamado de “dicromatismo sexual dinâmico” — Foto: Susanne Stückler e Doris Preininger

Ao contrário de outros sinais de coloração no reino animal, o amarelo dos sapos não indica força, saúde ou maior aptidão para a reprodução. “Comparamos tamanho, peso e condição corporal. Os machos amarelos não eram necessariamente mais fortes ou maiores”, explicaram os autores ao site Mongabay.

A cor apenas indica sexo e estado reprodutivo, uma ferramenta de comunicação. A coloração dura cerca de dois dias, tempo suficiente para completar o ciclo reprodutivo, e depois desaparece à medida que os níveis hormonais retornam ao normal.

Breve (e caótica) temporada de acasalamento

O espetáculo ocorre com a chegada das primeiras chuvas de monção no sudeste asiático. Embora a estação chuvosa dure meses, o período de reprodução dos sapos-comuns-asiáticos se restringe a um ou dois dias no início dela.

Os machos se reúnem em poças e canais recém-formados, ficam amarelos e começam a coaxar em coro, atraindo as fêmeas. Quando chegam, as fêmeas são rapidamente agarradas e, após depositarem os ovos, fogem em disparada para escapar de outros machos ainda excitados. “Um dia após o evento, você só consegue ver os filamentos de ovos na água. Cerca de uma semana depois, os girinos eclodem e se dispersam”, relataram os cientistas.

 Susanne Stückler e Doris Preininger Às vezes, vários machos tentam acasalar simultaneamente com a mesma fêmea, formando “bolas de acasalamento”, o que pode até levar ao afogamento da fêmea — Foto: Susanne Stückler e Doris Preininger

Essa sincronia depende totalmente das chuvas. Mudanças climáticas podem desorganizar o evento, uma vez que podem vir a alterar o momento e a intensidade das monções e, como consequência, ameaçar a reprodução da espécie. Isso porque os filhotes precisam eclodir e se desenvolver o máximo possível antes do inverno para terem a melhor chance de sobrevivência.

A transformação para o amarelo não é instantânea, como ocorre em camaleões ou polvos. Nos sapos, ela leva cerca de dez minutos, impulsionada por hormônios e não por impulsos nervosos.

Os pesquisadores ainda investigam como o tom vibrante é mantido por tanto tempo, mas suspeitam de uma resposta fisiológica ligada aos hormônios do estresse, como a adrenalina. O que pode ter começado como um efeito colateral acabou se tornando um sinal visual poderoso, essencial para garantir o sucesso de uma reprodução rápida e coletiva.

Sob a pele, camadas de células cromatóforas contêm pigmentos escuros, amarelos e vermelhos, além de células que refletem a luz como pequenos espelhos. Quando os hormônios entram em ação, essas células se reorganizam, espalhando os pigmentos amarelos e inclinando as placas refletoras para produzir o brilho intenso.

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