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A expansão dos data centers no Brasil acirrou o debate entre eficiência energética e infraestrutura elétrica. Em painel realizado na Futurecom 2025, nesta quinta-feira, 2, especialistas apontaram um cenário de oportunidades e gargalos: o País se destaca pelo baixo custo da energia elétrica e pela abundância de fontes renováveis, mas enfrenta limitações logísticas e regulatórias que podem comprometer o chamado “time to market” — janela crítica de dois anos para viabilizar projetos de grande porte.
Segundo Mauricio Godoi, subeditor do CanalEnergia e mediador do painel, o Operador Nacional do Sistema (ONS) já recebeu 40 pedidos de instalação de data centers desde 2024. Desses, 30 são considerados viáveis, representando uma demanda de 2,5 GW. “Em junho de 2025, o Ministério de Minas e Energia recebeu 52 pedidos de acesso à rede básica. Apenas 18 foram aprovados. A demanda acumulada projetada ultrapassa 13 GW até 2035”, destacou.
Para Vitor Caram, diretor de Expansão LATAM da ODATA, a eficiência energética é o cerne do modelo de negócios de data centers. “O que vendemos é energia na forma de data center. Conectamos os hyperscales à rede elétrica para abrigar seus servidores. O desafio hoje não é mais tecnológico — é sistêmico. A eficiência elevou a densidade computacional a níveis que exigem redes modernizadas e transmissão disponível”, afirmou.
Segundo Caram, enquanto em 2015 um rack atingia entre 60 e 72 kVAs, hoje já existem protótipos com até 1 MW. O mercado brasileiro de data centers em operação já soma cerca de 700 MW, considerando apenas o processamento de dados. Com a nova política ReData, a expectativa é dobrar esse volume até 2030. “Se o processamento feito fora migrasse para o Brasil, o volume total poderia chegar a 6 GW. Mas a infraestrutura elétrica de São Paulo, por exemplo, está próxima do esgotamento até 2029”, alertou. A atratividade do Brasil, segundo ele, depende da agilidade em garantir acesso à energia. “Os projetos exigem horizonte de no máximo dois anos. Passado isso, o investidor busca outros mercados.”
Demanda em gigawatts exige nova lógica
A presidente da ABEEólica, Elbia Gannoum, ressaltou que o setor elétrico brasileiro enfrenta um novo paradigma. “Sempre planejamos e operamos com base em megawatts. Agora, a demanda chega em gigawatts. A digitalização puxada pelos data centers exige revisão profunda no modelo de planejamento”, afirmou.
Elbia defendeu que o setor está diante de uma oportunidade para alavancar a industrialização com base em energia limpa. “Estamos há três anos trabalhando na ‘rota de mercado’ com foco em três vetores: descarbonização da indústria, hidrogênio verde e atração de indústrias eletrointensivas, como os data centers. Precisamos criar mecanismos catalisadores, inclusive com marcos legais e garantias para os investidores. A geração está garantida. O gargalo está na rede de distribuição e no tempo de resposta.”
Incentivos e escassez se contrapõem
Do lado da política energética, Luiz Vianna, CEO da Thymos Energia, alertou para o problema da escassez regional de energia. “Uma indústria no Paraná consome 140 MW, por exemplo. Já um data center, pode demandar até 400 MW — e há estados que não têm essa disponibilidade. Temos pareceres técnicos com restrições e projetos sendo adiados em 5 a 6 anos”, disse.
Vianna apontou ainda para outras barreiras estruturais. “Mais de 90% da nossa matriz elétrica é limpa, mas falta mão de obra especializada. Também há problemas de conectividade. A abundância de energia não basta se não houver capacidade de entrega e planejamento para alocar essas cargas.”
O consenso entre os participantes é que a digitalização acelerada e a escalada do consumo dos data centers estão impondo uma reorganização na infraestrutura nacional. “O data center é comparável ao movimento das energias renováveis nos anos 2000: ele mobiliza o setor inteiro, com agendas multissetoriais”, definiu Vianna.
A urgência, no entanto, está no tempo. Como concluiu Elbia Gannoum, “o tempo é o nosso maior desafio. Se não nos adaptarmos rapidamente, perderemos a janela para tornar o Brasil protagonista nesse novo ciclo da revolução energética e digital.”