Mercado da prata em Londres entra em colapso com “short squeeze” histórico; entenda

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(Bloomberg) — O mercado londrino de prata mergulhou no caos após um enorme short squeeze, que levou o preço do metal a superar US$ 50 por onça pela segunda vez na história, reacendendo memórias da tentativa dos bilionários irmãos Hunt de dominar o mercado em 1980.

Os preços de referência em Londres dispararam para níveis quase sem precedentes em relação a Nova York. Operadores descreveram um mercado em que a liquidez praticamente desapareceu, deixando investidores vendidos em prata física sem acesso ao metal e forçados a pagar custos altíssimos para rolar suas posições.

O aperto é tão extremo que alguns traders estão reservando espaço em voos transatlânticos para enviar barras de prata — uma forma de transporte cara, normalmente usada apenas para ouro —, tentando lucrar com os grandes prêmios pagos em Londres.

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Não há hoje um “novo irmão Hunt” tentando dominar o mercado, dizem analistas e operadores, que apontam uma combinação de fatores para justificar a disparada dos preços. Ainda assim, o caos dos últimos dois dias lembra fortemente o episódio de 1980 — e, em alguns aspectos, é ainda mais extremo.

“Nunca vi nada igual. O que estamos observando na prata é algo totalmente sem precedentes”, disse Anant Jatia, diretor de investimentos do fundo Greenland Investment Management, especializado em commodities. “Atualmente, não há liquidez alguma.”

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Há mais de um século, Londres é o coração do mercado de metais preciosos, onde bancos definem os preços de referência globais de ouro e prata negociando barras armazenadas em cofres espalhados pela cidade. No fim de cada dia, caminhões blindados circulam entre esses cofres para liquidar fisicamente as transações.

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A recente disparada foi impulsionada, em grande parte, por uma onda de investimentos em ouro e prata, motivada por temores de endividamento crescente no Ocidente e desvalorização das moedas — movimento intensificado pelo impasse orçamentário e o fechamento parcial do governo dos EUA.

Mas o aperto também reflete dinâmicas específicas do mercado de prata, incluindo um aumento repentino da demanda na Índia, combinado à escassez de barras disponíveis e ao receio de que o metal possa sofrer tarifas de importação dos EUA.

O mercado depende das centenas de milhões de onças armazenadas em cofres londrinos para garantir liquidez. Esse estoque vem sendo reduzido há anos: primeiro, por déficits persistentes — já que a produção das minas não acompanha a demanda industrial (como a de painéis solares) — e, mais recentemente, por uma corrida para enviar prata aos EUA diante do temor de tarifas.

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Como resultado, os estoques em Londres caíram um terço desde meados de 2021. Boa parte disso está vinculada a fundos negociados em bolsa (ETFs), mas o volume realmente disponível para negociação — mantido em sua maioria por grandes bancos — despencou 75% desde 2019, para cerca de 200 milhões de onças, segundo cálculos da Bloomberg.

O aumento do interesse de investidores coincidiu, neste mês, com o salto na demanda indiana. Compradores do país, que vinham adquirindo prata em Hong Kong, mudaram o foco para Londres durante o feriado da Golden Week, afirma Daniel Ghali, da TD Securities. Um ETF indiano chegou a suspender novas aplicações na quinta-feira, alegando falta de metal no mercado local.

A London Bullion Market Association (LBMA), que representa bancos, refinarias e empresas de logística do setor, afirmou em nota que está “ciente da escassez no mercado de prata e monitorando ativamente a situação”.

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Recordes quebrados

Nos últimos dois dias, vários recordes foram ultrapassados.
O leilão diário de prata de Londres — realizado desde 1897 — registrou pela primeira vez cotações acima de US$ 50. O preço à vista (spot) atingiu um prêmio de até US$ 3 sobre os contratos futuros em Nova York, patamar visto apenas durante o colapso dos irmãos Hunt.

O custo de empréstimo da prata londrina para um dia superou 100% ao ano, nível que, segundo veteranos do mercado, ultrapassa o observado em 1980.
Outro sinal de estresse é o aumento das diferenças entre preços de compra e venda (spreads), que saltaram de cerca de US$ 0,03 por onça para mais de US$ 0,20.

“Os bancos não querem mais negociar entre si, então os spreads ficam enormes”, afirmou Robert Gottlieb, ex-trader de metais preciosos e diretor-gerente do JPMorgan Chase & Co. “Isso cria uma liquidez extremamente baixa.”

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Barras no avião

Em 1980, a tentativa de dominação dos irmãos Hunt foi contida por intervenções das bolsas de commodities — primeiro a Comex, depois a Chicago Board of Trade — que impuseram restrições às novas posições, permitindo apenas liquidações.

Na época, o preço recorde foi de US$ 52,50 por onça, em 21 de janeiro de 1980.
Hoje, não há solução fácil. O alívio virá apenas se mais prata chegar a Londres — seja por venda de ETFs e investidores, seja por envios aéreos de outras regiões.
E isso já começou a acontecer.

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Um executivo de logística relatou ter recebido, na última semana, pedidos urgentes de clientes querendo retirar prata dos cofres vinculados à Comex, em Nova York, para enviá-la a Londres.

Ele estima que os operadores estão tentando mover entre 15 e 30 milhões de onças, e que a Comex registrou, na sexta-feira, sua maior retirada diária em mais de quatro anos.

Outros acreditam que a prata começará a sair da China, onde o preço também está abaixo do londrino, embora em volumes menores devido à própria escassez no país.
“Haverá um movimento natural de retorno de material para Londres, o que deve normalizar o mercado”, disse Joseph Stefans, chefe de trading da MKS Pamp SA, uma das maiores refinadoras de metais preciosos do mundo. “É apenas uma questão de mobilizar os estoques parados em outras regiões e trazê-los de volta.”

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Ainda assim, alguns operadores resistem a exportar prata dos EUA, alegando logística complexa e temores de que o shutdown do governo atrasem processos alfandegários. Além disso, qualquer atraso de um dia pode custar caro diante do aperto londrino.

Persistem também preocupações de que Donald Trump imponha tarifas de importação sobre a prata, ao encerrar a investigação da Seção 232, que analisa minerais críticos — entre eles, a prata.

“Se não houver tarifas sobre o metal, isso pode aliviar a demanda nos EUA e reduzir a pressão sobre Londres”, afirmou Amy Gower, estrategista do Morgan Stanley. “Preços altos costumam resolver esse tipo de situação no curto prazo.

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