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A deterioração institucional nos Estados Unidos e a revolução em inteligência artificial (IA) estão alterando o mapa dos investimentos globais.
Para Bruno Serra, CIO do fundo Itaú Janeiro, a combinação entre um Federal Reserve (Fed) enfraquecido e um mercado de trabalho pressionado pela automação abre espaço para novas tendências, especialmente em ativos de proteção, como o ouro, e nas economias emergentes.
“Quando o Fed se fragiliza, a moeda também tende a enfraquecer. Isso muda completamente a dinâmica de para onde o dinheiro flui”, disse, ao analisar o novo ambiente macroeconômico internacional.
Ex-diretor de Política Monetária do Banco Central do Brasil, o gestor destacou que o cenário atual exige um olhar mais atento à curva de juros americana e ao papel da IA na produtividade global.
O executivo participou do podcast Stock Pickers, do InfoMoney, apresentado por Lucas Collazo.
Fed em xeque e ouro em alta
Serra observa que a crescente interferência política nas instituições norte-americanas, somada à incerteza sobre a sucessão no comando do Fed, gera um efeito cascata nos mercados.
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“Essa dúvida institucional enfraquece a confiança na moeda e favorece o ouro, que volta a se valorizar diante da percepção de deterioração”, afirmou.
Segundo ele, há pouco tempo o dólar e a bolsa americana eram apostas óbvias. Agora, o fluxo de capital está mais disperso.
“O jogo mudou. O dinheiro que antes ia naturalmente para a renda fixa americana hoje é questionado. A curva de juros está esticada e o Fed mostra menos força no cenário”
O gestor avalia que a pressão sobre o mercado de trabalho norte-americano, especialmente entre jovens e no setor de tecnologia, é um ponto-chave.
“As big techs, que foram as maiores contratantes dos últimos anos, já começam a demitir. A inteligência artificial está mudando a dinâmica do emprego e, quando o Fed perceber o impacto disso, vai precisar reagir”, afirmou.
Essas mudanças estruturais, segundo ele, reforçam a visão de que o ciclo de juros de longo prazo nos EUA tende a se manter inclinado. “O mercado de trabalho frouxo favorece o Fed a manter os juros baixos, e isso beneficia as nossas posições”, completou.
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O novo ciclo de investimentos impulsionado pela IA
O gestor traça um paralelo entre o boom atual de investimentos em tecnologia e o ciclo da bolha da internet nos anos 2000.
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“Naquela época, as empresas de tecnologia cresceram rápido demais, mas a infraestrutura ficou. Agora, estamos vendo algo parecido: a inteligência artificial vai gerar ganhos de produtividade que ainda não aparecem nos resultados, mas vão surgir”, afirmou.
Serra acredita que o efeito da IA deve se espalhar globalmente. “Hoje o crescimento está concentrado nas grandes companhias americanas. Mas, nos próximos anos, o aumento de produtividade deve alcançar economias emergentes, inclusive o Brasil”, disse.
Ele aposta em um ciclo de investimento (“capex”) intenso, que pode sustentar um novo boom de crescimento. “O PIB americano já mostra força puxado pelo investimento. Esse ciclo de produtividade pode ser o motor da próxima década”, observou.
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Apesar do entusiasmo, o gestor descarta a tese de que o atual movimento configure uma bolha.
“As empresas entregaram resultados sólidos, e os lucros crescem a dois dígitos. O preço das ações subiu, mas os fundamentos acompanharam. O mercado não está irracional”
IA, OpenAI e o risco da euforia
Para Serra, no entanto, há um ponto de atenção: o otimismo excessivo em torno da OpenAI. “O mercado está muito dependente do que a OpenAI pode entregar. Se os resultados não corresponderem às expectativas, pode haver correção nas ações ligadas à inteligência artificial”, alertou.
Ele mencionou que o entusiasmo atual se assemelha aos movimentos de euforia vistos com ações de varejo, como GameStop, e nas chamadas “meme stocks”. “Há bolhas pontuais, mas não sistêmicas. O S&P não está caro, considerando o desempenho das empresas líderes”, disse.
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O gestor também destacou que, embora o S&P e os fundos passivos estejam fortemente expostos às big techs, o índice se ajusta naturalmente. “Ele é bem construído para privilegiar os ganhadores. O investidor institucional entende isso e continua racional. O exagero vem, geralmente, do investidor de varejo”, completou.
Oportunidades em emergentes e efeito global dos juros
Além dos EUA, Serra vê oportunidades em países emergentes diante do cenário de dólar mais fraco e desinflação global. “O enfraquecimento do dólar é positivo para os ciclos monetários no mundo todo. Países como Brasil, México, Colômbia e até o Reino Unido devem se beneficiar com cortes de juros”, avaliou.
Ele explicou que a combinação de menor inflação e forte fluxo de capital cria um ambiente favorável para ativos de risco nesses mercados.
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“A Ásia está exportando bens mais baratos, e isso ajuda a reduzir a inflação em outras regiões. Esse efeito ainda vai aparecer nos próximos trimestres”, afirmou.
No caso brasileiro, Serra prefere cautela, especialmente em um ano eleitoral.
“O investidor estrangeiro olha para o Brasil com atenção, porque o país tem peso relevante nos índices emergentes. O que acontecer aqui pode influenciar todo o fluxo para a região”