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Faltam cerca de dois anos para a Conferência Mundial de Radiocomunicações de 2027 (WRC-27), mas o setor de satélites já se prepara para debates que devem marcar o próximo encontro global sobre uso de espectro. A expectativa é que regras para convivência entre diferentes sistemas satelitais seja um dos principais temas em debate, impulsionado pelo avanço das constelações de baixa órbita.
No Congresso Latinoamericano de Satélites, iniciado nesta terça-feira, 7, no Rio de Janeiro, especialistas indicaram que a agenda da WRC-27 deve ter entre 70% e 80% dos itens relacionados ao setor satelital. "Em 2023 o satélite ocupou grande espaço na WRC de Dubai, e 2027 vai ser a conferência do satélite", apontou Michelle Caldeira, da Associação Brasileira das Empresas de Telecomunicações por Satélite (Abrasat).
"A conferência terá papel crucial na regulação de tecnologias emergentes como o direct-to-device [D2D] e na proteção dos serviços de satélites existentes face ao surgimento de novas aplicações", resumiu a dirigente da entidade setorial.
Desafio similar foi destacado pela gerente de espectro da Anatel, Kim Mota. "Será necessário avaliar novas faixas e possibilidades de espectro aos satélites. O desafio é permitir as novas soluções e ao mesmo tempo proteger sistemas incumbentes, porque não queremos trocar uma solução pela outra, mas tê-los de forma complementar".
O debate na WRC-27 sobre a necessidade de convivência foi ainda fortemente destacado por Ryan Johnson, diretor sênior de Relações Governamentais e Regulatórias da operadora Viasat. "As grandes constelações podem consumir excessivamente os recursos de espectro compartilhado em detrimento de outros serviços", alertou o executivo.
Segundo Johnson, a próxima conferência precisa endereçar o risco de recursos espectrais serem monopolizados pela Starlink (a principal constelação de baixa órbita do mundo), ou, alternativamente, de ser criado um "duopólio" favorecendo a empresa e a constelação Kuiper, em construção pela Amazon. "Isso poderia ser desastroso para o setor".
Neste sentido, o executivo listou como desafios problemas de coexistência entre sistemas não-geoestacionários (como os de baixa órbita, ou LEO) e os geoestacionários nas bandas Ku, Ka, Q e V; além de propostas defendidas por mega constelações que poderiam aumentar o limite de interferências permitidas pelas mesmas sobre outros serviços.
"É fundamental garantir que existam oportunidades para todos", resumiu Ryan Johnson. Ele destaca que além de empresas, países também têm buscado acesso aos recursos satelitais, em meio à demanda por maior soberania.
No Brasil, existem hoje 15 sistemas não-geoestacionários de baixa órbita autorizados, com destaque para Starlink, Kuiper e OneWeb, além de outros voltados a nichos ou que ainda não entraram em operação. Também existem 45 satélites geoestacionários licenciados no País, indicaram dados apresentados pela Anatel nesta terça-feira.
A agenda
A convivência entre sistemas satelitais não é o único ponto estudado para discussão na WRC-27 que mobiliza o segmento. A agenda para a próxima conferência quadrienal é ampla, como mostra a imagem abaixo.
Kim Mota, da Anatel, destaca o item 1.13 da agenda, que visa estudos sobre o uso por sistemas satelitais de faixas hoje utilizadas por sistemas móveis terrestres. A motivação seria uma convergência entre redes móveis (como 5G e o 6G) e serviços prestados pelos satélites, abrindo caminho para uma conectividade ubíqua.
Já uma possível identificação da banda X para compartilhamento com serviços móveis (parte do item 1.7 da imagem) é considerada uma preocupação para operadoras de satélites que atuam na faixa, afirma Michelle Caldeira, da Abrasat.
Outro item na pauta da WRC-27 são novas faixas para a operação das chamadas ESIMs, ou estações terrestres em movimento. A tecnologia em estudo será importante para a conectividade em aviões e embarcações marítimas.
Ainda, há o debate sobre sustentabilidade espacial, tema este que o Brasil tem sido um dos líderes na esfera global, e mesmo discussão sobre comunicações lunares auxiliadas por satélites.
Outro ponto importante é o início de um debate sobre como reguladores deverão se portar em caso de descumprimento de regras de proteção de espectro por operadores não-baseados em seu país.