ANUNCIE AQUI
As fraudes em projetos de mineração reveladas pela Polícia Federal na Operação Rejeito elevaram a pressão sobre a administração do governador Romeu Zema, em Minas, e também respingaram em outros personagens políticos ligados ao estado. Zema, que demorou mais de 24 horas para se manifestar sobre a operação, agora pode ter que enfrentar uma CPI na Assembleia Legislativa. Em Brasília, a deputada federal Duda Salabert (PDT-MG) também tenta colocar uma CPI de pé na Câmara, que poderia ampliar as investigações sobre órgãos federais, como a Agência Nacional de Mineração (ANM). Entre os presos pela operação, há pessoas ligadas a Jair Bolsonaro, Nikolas Ferreira (PL-MG), Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Alexandre Silveira (PSD-MG).
Segundo as investigações, o esquema poderia alcançar lucros de até R$18 bilhões para o grupo criminoso, formado por empresários, políticos, diretores de órgãos federais e estaduais de Minas, que obtiam autorizações para exploração mineral em locais originalmente proibidos através de pagamentos de propinas e influência política.
Deputados da oposição dizem que estão perto das 26 assinaturas necessárias para abrir a CPI na Assembleia Legislativa de Minas (ALMG) e acusam o governo Zema de omissão mesmo após denúncias anteriores à operação.
LISTA GRATUITA
10 small caps para investir
A lista de ações de setores promissores da Bolsa
Com a temperatura política interna elevada, Romeu Zema precisa das respostas sobre o caso de corrupção justamente no momento que tenta viabilizar sua candidatura à presidência, no ano que vem. Há um mês, ele oficializou sua pré-candidatura, em um evento em São Paulo, e vem sendo um dos governadores de direita mais enfáticos nas críticas à gestão Lula.
“A Assembleia enfrentou fortemente os crimes na mineração quando aprovou a Lei Mar de Lama Nunca Mais (após os desastres de Mariana e Brumadinho). Apesar disso, anos depois a investigação da PF mostrou que ainda há crime a ser enfrentado, dano ambiental a ser combatido e secretaria de meio ambiente a ser vigiada”, afirmou a deputada estadual Lohanna França (PV) . “A postura do governo é inconsequente e de quem reconhece, nas atitudes, que tem culpa, porque estão operando contra a CPI.”
O deputado Professor Cleiton (PV-MG) disse que o escândalo foi produzido por uma “quadrilha que se instaurou na administração do NOVO em Minas Gerais”.
Continua depois da publicidade
“O Governador tenta descolar a sua imagem desse escândalo, mas contribuiu diretamente para o que está ocorrendo. Uma série de decretos permissivos, uma reforma administrativa que fragilizou a fiscalização. Foram diversas denúncias pela imprensa e pela ALMG que não resultaram em nada, em um claro trabalho do núcleo do governo Zema pra abafar a situação. Os avisos foram muitos.”
No dia seguinte à Operação, Romeu Zema afirmou que “já havia suspeitas da CGE” e cobrou punições exemplares aos envolvidos. Ontem, o vice-governador, Mateus Simões (Novo), destacou que foram exonerados sete servidores em função das acusações. Em entrevista ao jornal O Tempo, ele defendeu uma atuação “severa” do poder público contra a corrupção, sem “passar pano para absolutamente ninguém que comete deslize”.
Ainda que não tenha atingido secretários diretamente, a Operação Rejeito prendeu integrantes do segundo escalão do governo, como Fernando Baliani, diretor Regional da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam). Nesse ano, ele havia sido demitido e readmitido do cargo em três semanas. Primeiro, dia 19 de julho foi demitido por “graves descumprimentos de deveres funcionais”, por determinação da Controladoria Geral do Estado (CGE). Mas, no dia 9 de agosto, sua demissão foi revertida em suspensão e ele foi readmitido, por decisão do próprio controlador-geral do estado, Rodrigo Fontenelle.
Continua depois da publicidade
Outro alvo da PF foi o ex- presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), Rodrigo Gonçalves Franco. Ele foi nomeado em novembro de 2023 por Zema, apenas três meses após o governador ter indicado a recondução do presidente anterior. Uma “mudança de ideia” que não costuma ser comum nesse tipo de processo, apontam pessoas que acompanham a política ambiental mineira.
Franco foi exonerado há uma semana, quatro dias antes da Operação, por causa de “fofocas” nos bastidores, segundo o secretário de Comunicação de Minas, Bernardo Santos. No entanto, em audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos da ALMG, nesta quinta (25), a secretária de Meio Ambiente, Marília de Carvalho Melo, disse que, na verdade, ele foi exonerado devido a uma denúncia formal encaminhada à Controladoria-Geral do Estado (CGE). Na mesma audiência, o controlador-geral do Estado, Rodrigo Fontenelle, disse que seis processos de licenciamento ambiental estão sob investigação.
A audiência foi marcada pelo protesto de deputados da oposição, que cobravam a CPI. A base do governo Zema, que é maioria na ALMG, rebatia dizendo que a investigação deve ficar a cargo apenas da Polícia Federal, e lançando críticas à gestão federal, também afetada pela Operação Rejeito. Em resposta, os opositores destacavam que a deputada federal Duda Salabert (PDT-MG), da base do governo federal, está articulando uma CPI na Câmara, o que comprovaria que não há pré disposição em blindar o governo Lula nesse assunto.
Continua depois da publicidade
Dois dos presos pela PF foram indicados pelo Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD-MG): um dos diretores da Agência Nacional de Mineração (ANM) Caio Trivelatto, e Rodrigo Teixeira, que até ano passado era diretor da Polícia Administrativa da PF e, desde o início desse ano, trabalhava no Serviço Geológico Brasileiro (SGB). Como revelou a coluna da Malu Gaspar, Teixeira era, até a data da operação, integrante do Comitê de Segurança, Meio Ambiente e Saúde da Petrobras, indicado por Silveira por fazer parte do grupo dos “Silveirinhas”, como é conhecido o pessoal de confiança do ministro.
Na segunda (22), Alexandre Silveira disse ter ficado surpreso com as prisões e cobrou investigações.
“Ficamos todos surpresos. É importante ressaltar que os dois nomeados no governo federal foram afastados, o que demonstra a prioridade das instituições sobre as pessoas, visando garantir que a justiça cumpra sua função”, disse.
Continua depois da publicidade
Outro preso pela operação foi Felipe Lombardi Martins, ex-assessor do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apontado como pré-candidato ao governo de Minas com apoio de Lula. Segundo a PF, Felipe Lombardi Martins era o “operador financeiro” da organização e definido como “homem da mala”.
Seus crimes teriam acontecido depois de sua atuação, entre 2019 e 2021, como assessor de Pacheco. A aproximação entre os dois aconteceu por intermédio de João Alberto Lages, ex-deputado estadual pelo MDB e apontado pela PF como um dos líderes do grupo criminoso. Em 2014, Lages concorreu às eleições em uma dobradinha com Pacheco.
Procurado, o senador Rodrigo Pacheco confirmou conhecer Lages, “em razão da militância político-partidária” e que na mesma época conheceu Lombardi, que trabalhou na sua equipe do Senado. Pacheco destacou que não teve conhecimento sobre as atividades de Lombardi após seu desligamento.
Continua depois da publicidade
O homem apontado pela PF como “articulador interinstitucional da organização criminosa” recebeu apoio de Jair Bolsonaro (PL) e do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) em sua tentativa de concorrer à presidência do Crea-MG, em 2023. Voluntário da campanha de Bruno Engler (PL-MG) a prefeito de Belo Horizonte, o geógrafo Gilberto Horta de Carvalho mostra, nas suas redes, proximidades com nomes importantes do bolsonarismo.
Em um vídeo de novembro de 2023, Ferreira pediu votos a Carvalho sob o argumento de ele ser uma pessoa de direita.
“A gente sabe que durante muito tempo a esquerda se aparelhou nesses conselhos e a gente precisa desaparelhar isso para, no final das contas, servir a quem é de direita”, disse Nikolas no vídeo.
Na sequência, no vídeo, Carvalho disse que sua candidatura servia para “limpar o sistema de engenheiros da esquerda”. Ele perdeu a eleição para Marcos Gervásio. Em suas redes sociais, o geógrafo mostra que trabalhou na campanha de Bruno Engler (PL-MG) para prefeito de Belo Horizonte ano passado. Procurado, Engler afirmou que ele era um voluntário.
A foto de perfil de Carvalho no Instagram é justamente uma imagem ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro, que também pediu votos para Carvalho na campanha à presidência do Crea.
“Ninguém no mundo todo tem o potencial que nós temos em recursos minerais. Vote em conservadores e pessoas de direita que vão revolucionar de verdade esse setor tão importante para todos nós”, disse Bolsonaro, no vídeo ao lado de Carvalho.
A proximidade de Carvalho com o meio bolsonarista teria impulsionado, inclusive, uma denúncia de suposta irregularidade eleitoral feita ano passado por Nikolas Ferreira contra Duda Salabert. Segundo a PF, a denúncia foi abastecida por informações do grupo criminoso, que tinha Salabert como rival por sua atuação em defesa da Serra do Curral, um dos locais explorados pela mineração.
O inquérito da Operação Rejeito, obtido pelo OGLOBO, reuniu prints de conversa que mostram João Lages enviando arquivos sobre as supostas irregularidades eleitorais de Salabert a Gilberto Carvalho, em 8 de outubro de 2024. Na sequência, Lages pede “jornalismo investigativo em cima dela”. Em resposta, Carvalho promete que não iria revelar que Lages era a fonte daquelas informações. Ele completa afirmando que entregaria os arquivos para “pessoas capacitadas”. Em novembro, Nikolas protocolou a denúncia.
Procurado, Nikolas Ferreira disse que a denúncia “teve como fundamento informações já publicadas em veículos de imprensa de grande circulação”.